Governança da Internet ou dos amigos?

No último dia 23 de agosto, o Comitê Gestor da Internet no Brasil aprovou um patrocínio para a realização de um evento, de resultados são bastante duvidosos, no valor de R$ 500 mil.

O evento: “Brasil-Canada 3.0”, que ainda será realizado em João Pessoa (PB), entre os dias 5 e 6 de dezembro – só foi aprovado porque o terceiro setor com assento no CGI forçou a barra. Isso ficou claro na Ata da reunião publicada pelo próprio CGI em sua página.

227980_226228277387855_7744557_nO “Brasil-Canadá 3.0 está sendo organizado pela ANID – Associação Nacional para o Inclusão Digital, uma ONG, cujo presidente, Percival Henriques de Souza Neto (Foto), além de conselheiro do Comitê Gestor, se apresenta no Facebook como presidente do PCdoB da Paraíba.

Apenas o conselheiro Flávio Wagner, da Comunidade Científica, se absteve de votar. Os demais conselheiros presentes aprovaram a proposta sem contestações claras – já que não fizeram constá-las em Ata – e com base em argumentos um tanto frágeis.

O secretário-executivo do CGI.br, Hartmut Richard Glaser, apresentou a proposta da ANID valendo-se do argumento de que essa é uma estratégia do órgão, de fazer parcerias desse gênero com governos de outros países, com o apoio do Ministério das Relações Exteriores. Acrescentou que no ano passado o CGI já havia apoiado evento similar. Não foi colocada à mesa, quanto o governo canadense pretende colocar em dinheiro nessa parceria. Nem tampouco informou se o Governo da Paraíba ou o MRE contribuirão para a realização do evento. Aparentemente não vão.

Percival Henriques alegou que no ano passado o Ministério das Relações Exteriores e o governo paraíbano bancaram a iniciativa, sem informar o montante dos patrocínios de cada organismo. Sobre o Governo do Canadá nenhuma menção de que tenha patrocinado algo.

Durante a reunião, alguns integrantes do CGI chegaram a defender que “eventos desse porte deverão ser apresentados para avaliação com mais antecedência e com maior detalhamento”. Mas ninguém levantou a voz para pedir vistas e cobrar mais informações, antes de aprovar o patrocínio de R$ 500 mil.

O “Brasil-Canada 3.0”, na definição que os organizadores publicaram no site oficial: “é uma conferência nacional que trata das mídias digitais e dos seus impactos na sociedade. O objeto central da conferência é definir desafios do futuro digital do Brasil com o engajamento e a participação de vários setores da sociedade”. 

O evento deixa uma grande margem para dúvidas quanto à proposta de se tornar numa “conferência nacional”. Afora a informação de que contará com a presença do ministro das Comunicações, não há mais nada que corrobore essa tese. Está sendo realizado na Paraíba, fora dos grandes eixos regionais que lidam com os temas propostos como “Processos Criativos na Industria da Convergência”.

Para não dizerem que estou discriminando o Estado ou a região, também apresento outro fato que demonstra que o argumento para que esta Conferência ganhe o status de “evento nacional” não é convincente e devia ter merecido maior atenção dos demais mebros do CGI antes de aprová-lo:

A relação de inscritos apresentada até agora no site oficial que promove o evento, mostra que ele está mais para um seminário regional ou estadual, do que um evento de grande porte nacional. Na relação conta-se nos dedos a presença de interessados no tema que sejam fora da Paraíba. Nem mesmo está sendo registrada uma grande presença de participantes do Nordeste.

Fica evidenciado que o CGI aprova patrocínios sem um mínimo de critério e aparentemente privilegiando quem faz parte do Coimitê Gestor. Na mesma reunião, por exemplo, aprovaram outros dois patrocínios, sem uma discussão prévia do alcance que eles terão, em vista dos objetivos que se propõem.

Para atender um pedido do setor empresarial, foi aprovado em nome da Assespro, um patrocínio de R$ 20 mil para realização de um evento no último dia 14 de outubro, em Copacabana (RJ), cujo o tema era: “Pensando TI”.

Também foi aprovado um patrocínio de R$ 10 mil para o “Meeting Direito Digital ABDTIC Porto Alegre”, promovido pela Associação Brasileira de Direito da Tecnologia da Informação e das Comunicações.

Não se trata aqui de questionar a relevância do papel que o Comitê Gestor da Internet presta ao Brasil e nem tampouco o apoio que a presidenta Dilma tem dado ao organismo, na discussão de uma Governança da Internet.

Mas certamente tanto a presidenta, quanto os integrantes do governo no CGI, devem ter maior cuidado com o uso deste dinheiro, pois da forma como tem sido gasto, fica a dúvida se não existe um balcão montado dentro do órgão para favorecer os interesses de integrantes, nada preocupados em prestar contas dos seus atos à sociedade.

*A reunião que aprovou esse patrocínio contou com as presenças dos seguintes conselheiros:

Adriano Silva Mota – Representante do Ministério da Defesa;
Carlos Alberto Afonso – Representante do Terceiro Setor;
Cássio Jordão Motta Vecchiatti – Representante da Comunidade Empresarial Usuária;
Demi Getschko – Representante de Notório Saber em Assuntos de Internet;
Eduardo Fumes Parajo – Representante dos Provedores de Acesso e Conteúdo da Internet;
Ernesto Costa de Paula – Representante do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico;
Flávio Rech Wagner – Representante da Comunidade Científica e Tecnológica; (abstenção)
Henrique Faulhaber Barbosa – Representante da Indústria de Bens de Informática, de Bens de Telecomunicações e de Software;
Luiz Antonio de Souza Cordeiro – Representante do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;
Maximiliano Salvadori Martinhão – Representante do Ministério das Comunicações;
Nazaré Lopes Bretas – Representante do Minstério do Planejamento, Orçamento e Gestão;
Percival Henriques de Souza Neto – Representante do Terceiro Setor;
Veridiana Alimonti – Representante do Terceiro Setor;
Virgilio Augusto Fernandes Almeida – Representante do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.