Projeto de banda larga do MCTIC com a RNP é frágil juridicamente para o governo

O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações, precisa vir à público explicar como pretende gastar R$ 300 milhões, orçamento considerado “baratinho” pelo secretário de Telecomunicações, Vitor Elisio Góes De Oliveira Menezes, num projeto que visa dotar a região amazônica de rede de banda larga fixa, que inclui parte da região Nordeste.

Capital Digital vem informando há duas edições, que esse projeto, ainda não explicado claramente pelo MCTIC, já conta com um parceiro privado, que desde março ganhou o privilégio de sentar-se à mesa para discuti-lo com a cúpula das Comunicações do Governo Bolsonaro: a empresa Junto Telecom.

A fragilidade jurídica de um projeto que terá recursos públicos, mas execução feita por entes privados, está justamente na possibilidade não tão remota de um dia esse acordo de cooperação vir a naufragar e o governo simplesmente perder o controle de uma rede que, em princípio não é sua. Caso muito semelhante já ocorreu anos atrás com a Eletronet, que foi parar no judiciário para solução de um conflito sobre controle societário, pois envolvia empresa privada, de capital estrangeiro, em seu bloco de controle.

Embora seja tratada como órgão de governo, a RNP – Rede Nacional de Ensino e Pesquisa é uma associação civil, criada como uma Organização Social, lastreada pelo Decreto 4.077 de janeiro de 2002, instituído no Governo Fernando Henrique Cardoso. Passou a ser tratada como um apêndice do MCTIC e do Ministério da Educação (MEC), porque após ser criada ganhou contratos com os dois ministérios para gestão da rede de ensino e pesquisa, denominada “Rede Ipê”.

No jargão das compras governamentais, o mercado privado costuma chamar esse procedimento de “barriga de aluguel”, já que em determinados projetos a RNP entra com o trabalho de construção da rede, busca parceiros privados ao seu bel prazer, sem a necessidade dos ministérios se envolverem em trabalhosos processos licitatórios para a escolha de empresas. É um procedimento que, do ponto de vista ministerial, torna mais ágil a execução do projeto, pois livra a pasta do incômodo “assédio” dos organismos de controle, aqueles auditores chatos que cuidam do dinheiro e do patrimônio públicos.

Talvez por isso se explique a longevidade no cargo do diretor-geral da RNP, Nelson Simões, que ingressou em 2002 no comando da entidade e de lá nunca mais saiu. Se o organismo fosse público, vinculado, de fato, ao governo, Simões não teria conseguido atravessar os Governos Fernando Henrique Cardoso (2002), Lula (2003/2010), Dilma (2011/2016) Temer (2016/2018) e agora convive com o Governo Bolsonaro (2019). Fatalmente teria caído por conta do assédio político aos cargos ministeriais.

Mas voltando ao projeto de banda larga fixa “baratinho”, conforme definiu o secretário de Telecomunicações, como ficaria a situação de uma eventual troca de fibras ópticas por serviços de manutenção, prestados pela empresa Junto Telecom? É de se indagar se tais fibras podem ser cedidas pela RNP para uma empresa privada, se foram compradas e instaladas com apoio de dinheiro publico? Também é de se indagar: e se por um desses azares da vida algum dia esse acordo for rompido pelo governo. Com quem ficará o controle das fibras compradas e construídas para uma suposta rede governamental?

A empresa Junto Telecom já tem um acordo prévio coma RNP no valor de R$ 4 milhões, para expansão de infraestrutura de redes, que envolve manutenção e cessão de fibras ópticas, adquiridas através de recursos públicos. Qual seria a meta agora da empresa? Abocanhar pelo menos mais uma boa parte dos R$ 300 milhões que o governo espera colocar num projeto que visa implantar novas conexões de rede de banda larga fixa em parte da região Amazônica e também do Nordeste?

Aparentemente sim, pois desde março a “parceira” da RNP vem frequentando reuniões à portas fechadas com a cúpula das Telecomunicações do Ministério da Ciência e Tecnologia. Um privilégio que não tem sido visto ser concedido para outras empresas do mercado, muito menos para as entidades que defendem os interesses dessas empresas.

Outra questão curiosa nessas tratativas entre RNP e o MCTIC , com a participação de empresas privadas, é saber que o diretor de Engenharia e Operações da RNP, Eduardo Cesar Grizendi, ao mesmo tempo é dono de uma empresa de Consultoria, que encontra-se “ativa” no mercado.

Grizendi é “sócio Administrador” na empresa Telecom Biz Tecnologia e Sistemas, cujas atividades principais seriam, o comércio varejista de equipamentos de telecomunicações e consultoria em Tecnologia da Informação. Ao que parece, tudo absolutamente normal, para um governo repleto de empresários ocupando postos-chave na administração de ministérios e empresas estatais.

Taí o ministro Marcos Pontes que não nos deixa mentir, após ter contratado a sócia para fazer as Comunicação Social do MCTIC. Como bem disse o secretário Vitor Elísio, a “mão invisível do Estado” opera verdadeiros milagres quando entra com os seus “petelecos” num projeto.