Para aqueles que acham que vender tudo é a solução

No início do Governo Lula, o então presidente resolveu mexer com um vespeiro: ele acabou com os bingos que proliferavam no Brasil. Por meio de uma Medida Provisória Lula fechou a atividade no país.

A reação na mídia foi imediata, com os donos de bingo anunciando a demissão de uns 240 mil trabalhadores com carteira assinada. A notícia causou o maior rebuliço no governo.

Afinal de contas, como Lula, o defensor dos trabalhadores, poderia ter tomado a decisão de demitir 240 mil funcionários de bingos?

A notícia tirou o sono do presidente. Ele procurou o então ministro do Trabalho e Emprego, Ricardo Berzoini, para cobrar explicações e informações sobre quantos trabalhadores estavam perdendo o emprego com a sua decisão.

Berzoini então procurou dentro do ministério as informações e descobriu que não havia um sistema que pudesse dá-la em tempo real.

A empresa terceirizada na época era a Politec. Ela praticamente mandava no ministério, pois apenas o Coordenador de Informática era da casa. Os demais “funcionários” eram todos terceirizados.

A Politec alegava que iria precisar de no mínimo uma semana para apurar as informações nos cadastros, sobretudo, no Caged – Cadastro Geral de Empregados e Desempregados – porque tudo era mantido em planilhas Excel ou em Word.

Agora imaginem a cena: o ministro do Trabalho não pode informar o presidente quantos trabalhadores com carteira serão demitidos, caso os bingos sejam obrigados a fechar as portas, porque a empresa de informática terceirizada queria no mínimo uma semana para levantar as informações. Seria a primeira derrota de Lula justamente no seu calcanhar de Aquiles: emprego.

Coube a um amigo, que na época era uma boa fonte, como funcionário do INSS, dar a solução para o problema. Ele era militante do PT, ferrenho defensor de Lula, e sabia o preço que o presidente iria pagar politicamente com os donos de bingos diariamente anunciando as demissões em massa de trabalhadores.

Infelizmente ele já faleceu, portanto, não haverá de ser acusado pela única atitude que podia tomar na época para salvar a pele de um presidente. Ao escrever esse artigo, espero estar homenageando e dando a ele, mesmo morto, o direito de ainda ecoar através das ondas do tempo o seu grito “não à privatização”. Pois certamente era o que ele faria, se estivesse vivo.

Essa fonte procurou o pessoal da Politec no ministério.

E com uma pequena “doação” para o bolso de uma “alma pura”, que trabalhava para esta empresa, conseguiu que o sujeito pegasse as planilhas e fosse conferindo os nomes, um a um, para saber o total de trabalhadores com carteira assinada pelas casas de bingos.

E 24 horas depois o ministro Berzoini pode cumprir a missão de entregar ao presidente um relatório. Cuja informação principal era que apenas uns 200 trabalhadores tinham efetivamente carteira assinada, num universo de 240 mil que perderiam o emprego com o fechamento dos bingos, conforme anunciavam os empresários.

Eu publiquei essa História na época e quase degolei sem querer essa minha fonte. Deu a maior confusão no governo, mas também serviu para mostrar a eles o grau de dependência, o quanto eram reféns em obter informações estratégicas que estavam sob a guarda de uma empresa privada e terceirizada.

Agora transfiram esse cenário lá de trás para o futuro, quando o governo estiver achando que fez um ótimo negócio ao entregar todos os bancos de dados federais para controle das empresas privadas, depois que vendeu as estatais de Tecnologia.

*Insisto que vender para depois depender não é a melhor solução.