BNDES já ouviu o mercado sobre a venda do Serpro e Dataprev no final de 2021 (II)

O banco trabalha com prazos bem apertados, que contradizem o discurso do ex-secretário das privatizações, Salim Mattar, de que o governo tem sido moroso no processo de venda das empresas públicas. Se esta era a razão, o documento do BNDES mostra exatamente o contrário. O mercado já foi consultado sobre a venda das empresas, em reuniões que até o próprio governo (clientes das estatais) foram ouvidos.

Como no documento do banco não há registro de datas de reuniões, supõe-se que elas ocorreram no primeiro semestre deste ano, mesmo com o isolamento provocado pela pandemia do Coronavírus. Tais encontros teriam começado a partir de janeiro, após o governo ter publicado os dois decretos assinados pelo presidente Jair Bolsonaro, que colocaram o Serpro (nº 10.206) e a Dataprev (nº 10.199) no Programa Nacional de Desestatização (PND).

Consultorias Internacionais

Segundo o documento do BNDES em poder deste site, 13 grandes empresas de consultoria internacionais e mais a Fundação Getúlio Vargas foram ouvidas separadamente por membros do governo diretamente envolvidos com o processo de privatizações. Foram reuniões prévias para avaliar com essas empresas a realização de estudos que embasem tecnicamente a venda das estatais.

Além dessas consultorias, também foram ouvidos a direção das duas estatais e os principais clientes governamentais do Serpro e da Dataprev (Receita Federal, Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, Tesouro Nacional e INSS). Eles puderam opinar sobre os impactos em seus serviços caso ocorra a venda dessas empresas públicas. O documento não faz nenhuma menção se algum “cliente” do Serpro ou da Dataprev se opôs à venda das empresas.

Até mesmo o setor privado foi convidado a falar sobre a venda das estatais de TI, em reunião que ocorreu com a Brasscom, a entidade que representa as maiores empresas do mercado privado de TI no Brasil. Que possivelmente serão os compradores das estatais.

A presença de consultorias internacionais sinaliza a preocupação do governo em tornar o processo de venda incontestável no futuro. Pois foram chamadas algumas das 20 maiores empresas ranqueadas mundialmente pela Vault Consulting, São elas:

McKinsey & Company 1ª
Bain & Company – 2ª
BCG – Boston Consulting Group 3ª
Delloite – 4ª
Oliver Wyman – 5ª
EY-Partenon – 7ª
PwC – 8ª
Accenture – 10ª
Kearney – 11ª
KPMG – 12ª
LEK Consulting – 14ª
Roland Berger – 17ª
Alvarez & Marsal – 20ª
FGV – não listada

Contratação/Cronograma

No documento do BNDES aparentemente há sinais de que o processo de contratação da consultoria pode estar atrasando e, se de fato isso ocorrer, acabará encurtando o prazo de entrega dos primeiros estudos previstos para o início de 2021.

Considerando que já entramos em setembro, restariam pouco mais de dois meses ( se contratada agora) para que a consultoria vencedora do certame possa elaborar os estudos de viabilidade da venda do Serpro e da Dataprev, com previsão para entrega dos trabalhos no primeiro trimestre de 2021.

Os estudos

Um dos slides da apresentação do BNDES em provável reunião de governo, mostra a relação de estudos que terão de ser feitos pela consultoria contratada para a concretização de um modelo de venda do Serpro e da Dataprev. Ao todo são 14 relatórios que fazem uma radiografia completa da situação das duas empresas.

Alguns relatórios são interessantes, porque podem assegurar a atratividade dos interessados na compra. Entre eles o relatório que trata das experiências internacionais de modelos de contratações de TI por entes públicos. No Brasil, essa contratações são diretas (sem licitação) quando se trata do Serpro ou da Dataprev prestarem um serviço a um órgão de governo.

Se comparados com modelos diferentes ao redor do mundo, que não contemplem esse privilégio na escolha do prestador estatal do serviço, essa dispensa de licitação conferida no Brasil pode ser um chamariz para os investidores, porque após a compra terão acesso aos principais contratos – além dos mais caros – do governo.

Outro relatório em destaque é o que trata da segurança e da proteção de dados. Como o processo de venda do Serpro e da Dataprev só estará concluído no final de 2021, espera-se que até lá a Lei Geral de Proteção de Dados já esteja em vigor quanto a aplicação das multas para os casos que descumprirem a legislação. Tal relatório deverá informar em que grau de maturidade estariam as estatais em relação à nova lei.

Pelo cronograma do BNDES, o processo e venda das duas empresas ocorrerá até dezembro de 2021 e a concretização do negócio ( burocracia e transferência de controle societário) ocorrerá no primeiro semestre de 2022. Último ano do primeiro mandato do presidente Jair Bolsonaro que, ao que tudo indica, tentará a reeleição.

*No capítulo III – ainda a ser publicado hoje – será abordado o critério de escolha da consultoria internacional. E há indício de risco de favorecimento a uma grande empresa deste mercado.